Uma das modalidades de regularização fundiária
REURB – Lei – 13.465/2017
l – CONCEITO
REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA URBANA (Reurb) é o processo que inclui medidas jurídicas, urbanísticas, ambientais e sociais com a finalidade de incorporar os núcleos urbanos informais ao ordenamento territorial urbano e à titulação de seus ocupantes.
As medidas jurídicas correspondem especialmente à solução dos problemas dominiais, referente às situações em que o ocupante de uma área pública ou privada não possui um título que lhe dê segurança jurídica sobre sua ocupação. É o aspecto da falta de um “documento” que dê a plena propriedade ao beneficiário direto da Reurb.
As medidas urbanísticas dizem respeito às soluções para adequar os parcelamentos à cidade regularizada, como a implantação de infraestrutura essencial (calçamento, esgoto, energia, fornecimento de água), decorrentes dos loteamentos implantados sem atendimento das normas legais. A realocação de moradias em face de estarem em locais sujeito a desmoronamento, enchentes, em locais contaminados, insalubres, entre outros, também entra nesse aspecto.
As medidas ambientais buscam superar o problema dos assentamentos implantados sem licenciamento ambiental e em desacordo com a legislação urbana e de proteção ao meio ambiente.
As medidas sociais, por sua vez, dizem respeito às soluções dadas à população beneficiária da Reurb, especialmente nas ocupações por famílias de baixa renda, (mas não excluindo as demais populações), de forma a propiciar o exercício digno do direito à moradia e à cidadania, proporcionando qualidade de vida.
II. ESPÉCIES
A Lei Federal nº 13.465/2017, de 11 de julho de 2017, define três espécies de regularização fundiária, que atingem em sua totalidade as propriedades urbanas irregulares no Brasil:
a. Regularização Fundiária de Interesse Social (Reurb – S) – Regularização fundiária aplicável aos núcleos urbanos informais ocupados predominantemente (50 % + 1), por população de baixa renda, assim declarados em ato do Poder Executivo municipal. Embora possam ser definidas através de ZEIS, que, em regra, são definidas no Plano Diretor Urbano de cada município, as áreas objetos de Reurb–S podem ser definidas através de ato do poder público (decreto, por ex.), especialmente nos pequenos municípios, que não têm a obrigatoriedade de criação do Plano Diretor Urbano pelo Estatuto das Cidades (Art. 41, I, da Lei 10.257/2001). Considerando os dados colhidos por órgãos governamentais de pesquisa, como o IBGE (PIB, IDH, PIB per capita, presença de mobiliários nos domicílios, entre outros), a grande maioria dos municípios têm
amparo estatístico para definir, através de ato do executivo municipal, quais serão estas áreas, podendo em todo tempo ser revista a definição das áreas objeto de Reurb-S (art. 30, § 3º, da Lei 13.465/2017), não sendo necessários gastos com estudos técnicos mais apurados nestes casos.
b. Regularização Fundiária de Interesse Específico (Reurb-E) – Regularização fundiária aplicável aos núcleos urbanos informais ocupados por população não qualificada na hipótese anterior. A lei adotou um critério residual. São os núcleos urbanos informais ocupados por população com melhores condições de vida, mas que ainda não possuem uma moradia juridicamente regularizada, não têm um documento de sua propriedade. Ressalte-se que dentro dos núcleos urbanos informais objeto de Reurb-E podem haver moradias ocupadas por moradores de baixa renda. E o contrário também é verdadeiro, nas áreas de Reurb–S haverá famílias que não são de baixa renda, mas que também serão beneficiados pelo critério. O que se delimita é a área com predominância de uma ou outra população, e não a renda específica de uma determinada família.
c. Regularização Fundiária Inominada (Reurb–I) – Regularização fundiária aplicável aos núcleos urbanos informais consolidados em data anterior à Lei do Parcelamento do Solo Urbano – Lei 6.766/1979, de 19 de dezembro 1979 (art. 69, da Lei 13.465/2017). Esta espécie se aplica em conjunto com as duas outras (Reurb-S e Reurb-E), e, neste caso, ela seria um “plus”, considerando que as medidas necessárias para sua efetivação são mitigadas pela lei, obviamente por ser aplicada em núcleo urbano informal consolidado há mais de 30 anos. Mas pode ser aplicada isoladamente, naquelas áreas que não sendo objeto de Reurb (S ou E), digam respeito a núcleos urbanos informais consolidados anteriormente à 19 de dezembro de 1979.
III OBSERVAÇÕES IMPORTANTES:
1. Critério diferenciador
A classificação do interesse (Reurb-S ou Reurb-E) visa exclusivamente à:
1.1 Identificação dos responsáveis pela implantação ou adequação das obras de infraestrutura essencial (art. 37 e 38, da Lei 13.465/2017):
Na Reurb – S, caberá ao poder público competente, diretamente ou por meio da administração pública indireta, implementar a infraestrutura essencial, os equipamentos comunitários e as melhorias habitacionais previstos nos projetos de regularização, assim como arcar com os ônus de sua manutenção.
Na Reurb-E, o Distrito Federal ou os Municípios deverão definir, por ocasião da aprovação dos projetos de regularização fundiária, nos limites da legislação de regência, os responsáveis pela:
I – implantação dos sistemas viários;
II – implantação da infraestrutura essencial e dos equipamentos públicos ou comunitários, quando for o caso; e
III – implementação das medidas de mitigação e compensação urbanística e ambiental, e dos estudos técnicos, quando for o caso.
A lei nº 13.465/2017 define, em seu art. 36, § 1º, que são considerados infraestrutura essencial os seguintes equipamentos:
I – sistema de abastecimento de água potável, coletivo ou individual;
II – sistema de coleta e tratamento do esgotamento sanitário, coletivo ou individual;
III – rede de energia elétrica domiciliar;
IV – soluções de drenagem, quando necessário; e
V – outros equipamentos a serem definidos pelos Municípios em função das necessidades locais e características regionais.
1.2 Ao reconhecimento do direito à gratuidade das custas e emolumentos notariais e registrais em favor daqueles a quem for atribuído o domínio das unidades imobiliárias regularizadas.
Serão isentos apenas na Reurb-S:
I – o primeiro registro da Reurb-S, o qual confere direitos reais aos seus beneficiários;
II – o registro da legitimação fundiária;
III – o registro do título de legitimação de posse e a sua conversão em título de propriedade;
IV – o registro da CRF e do projeto de regularização fundiária, com abertura de matrícula para cada unidade imobiliária urbana regularizada;
V – a primeira averbação de construção residencial, desde que respeitado o limite de até setenta metros quadrados;
VI – a aquisição do primeiro direito real sobre unidade imobiliária derivada da Reurb-S;
VII – o primeiro registro do direito real de laje no âmbito da Reurb-S; e
VIII – o fornecimento de certidões de registro para os atos anteriormente citados.
lV. Tributos e penalidades tributárias
Os atos referentes à Reurb (S ou E) independem da comprovação do pagamento de tributos ou penalidades tributárias, sendo vedado ao oficial de registro de imóveis exigir sua comprovação (art. 13, § 2º, da Lei 13.465/2017). Entre os exemplos cabíveis,
podemos citar o ITCMD (em caso de doação), ITBI (na compra e venda e outros direitos reais onerosos), INSS (nos casos de averbação de construção de até 70m²), taxas municipais, entre outros. A lei nº 13.465/2017 não veda a comprovação apenas para a Reurb-S, desta forma, uma doação feita pelo Município ao ocupante de um determinado imóvel objeto da Reurb-E também será abrangida pela isenção da comprovação (art. 13, § 2º, c/c art. 44, § 3º, da Lei 13.465/2017).
V. Áreas não residenciais
A REURB em imóveis com uso misto de atividades como forma de promover a integração social e a geração de emprego e renda no núcleo urbano informal regularizado.
Referida lei ainda dispõe, como requisito para a concessão do Título de Legitimação Fundiária ao beneficiário na Reurb-S, que, em caso de imóvel urbano com finalidade não residencial, seja reconhecido pelo poder público o interesse público de sua ocupação (art. 23, § 1º, III).
Considerando que a Lei nº 13.465/2017 não veda a concessão do Título de Legitimação Fundiária na Reurb-E, ao contrário, dispõe ser aplicável (art. 23, caput), entende-se possível que o Poder Público, demonstrando interesse público na ocupação, conceda o Título de Legitimação Fundiária ou outro instrumento de titularização cabível, aos ocupantes de imóveis não residenciais, também na Reurb-E. Afinal, é objetivo da lei possibilitar a regularização de todos os imóveis.
Vl. Dimensões dos lotes/requisitos urbanísticos
Para fins da Reurb, os Municípios poderão dispensar as exigências relativas ao percentual e às dimensões de áreas destinadas ao uso público ou ao tamanho dos lotes regularizados, assim como a outros parâmetros urbanísticos e edilícios (art. 11, § 1º).
Considerando que, em regra, esses requisitos e padrões urbanísticos são definidos em lei municipal/distrital, os municípios ou o DF deverão editar norma possibilitando a mitigação das exigências citadas.
Vll. Áreas de preservação permanente, áreas de unidade de conservação de uso sustentável ou de proteção de mananciais
A Reurb observará, também, o disposto nos arts. 64 e 65 da Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012 (Código Florestal), hipótese na qual se torna obrigatória a elaboração de estudos técnicos, no âmbito da Reurb, que justifiquem as melhorias ambientais em relação à situação de ocupação informal anterior, inclusive por meio de compensações ambientais, quando for o caso.
Na Reurb-S dos núcleos urbanos informais que ocupam Áreas de Preservação Permanente, a regularização fundiária será admitida por meio da aprovação do projeto de regularização fundiária, na forma da Lei nº 13.465/2017.
O projeto de regularização fundiária de interesse social deverá incluir estudo técnico que demonstre a melhoria das condições ambientais em relação à situação anterior com a
adoção das medidas nele preconizadas. Referido estudo deverá conter, no mínimo, os seguintes elementos: I – caracterização da situação ambiental da área a ser regularizada;
II – especificação dos sistemas de saneamento básico;
III – proposição de intervenções para a prevenção e o controle de riscos geotécnicos e de inundações;
IV – recuperação de áreas degradadas e daquelas não passíveis de regularização;
V – comprovação da melhoria das condições de sustentabilidade urbano-ambiental, considerados o uso adequado dos recursos hídricos, a não ocupação das áreas de risco e a proteção das unidades de conservação, quando for o caso;
VI – comprovação da melhoria da habitabilidade dos moradores propiciada pela regularização proposta; e
VII – garantia de acesso público às praias e aos corpos d’água.
Na Reurb-E dos núcleos urbanos informais que ocupam Áreas de Preservação Permanente não identificadas como áreas de risco, a regularização fundiária será admitida por meio da aprovação do projeto de regularização fundiária, na forma da lei específica de regularização fundiária urbana (Lei nº 13.465/2017).
O projeto de regularização fundiária de interesse específico deverá incluir estudo técnico que demonstre a melhoria das condições ambientais em relação à situação anterior e ser instruído com os seguintes elementos:
I – a caracterização físico-ambiental, social, cultural e econômica da área;
II – a identificação dos recursos ambientais, dos passivos e fragilidades ambientais e das restrições e potencialidades da área;
III – a especificação e a avaliação dos sistemas de infraestrutura urbana e de saneamento básico implantados, outros serviços e equipamentos públicos;
IV – a identificação das unidades de conservação e das áreas de proteção de mananciais na área de influência direta da ocupação, sejam elas águas superficiais ou subterrâneas;
V – a especificação da ocupação consolidada existente na área;
VI – a identificação das áreas consideradas de risco de inundações e de movimentos de massa rochosa, tais como deslizamento, queda e rolamento de blocos, corrida de lama e outras definidas como de risco geotécnico;
VII – a indicação das faixas ou áreas em que devem ser resguardadas as características típicas da Área de Preservação Permanente com a devida proposta de recuperação de áreas degradadas e daquelas não passíveis de regularização;
VIII – a avaliação dos riscos ambientais;
IX – a comprovação da melhoria das condições de sustentabilidade urbano-ambiental e de habitabilidade dos moradores a partir da regularização; e
X – a demonstração de garantia de acesso livre e gratuito pela população às praias e aos corpos d’água, quando couber.
Para fins da regularização ambiental ao longo dos rios ou de qualquer curso d’água, será mantida faixa não edificável com largura mínima de 15 (quinze) metros de cada lado.
Em áreas urbanas tombadas como patrimônio histórico e cultural, a faixa não edificável (largura mínima) poderá ser redefinida de maneira a atender aos parâmetros do ato do tombamento.
A Reurb pode ser feita por etapas/fases, atingindo somente as áreas que não abrangem áreas ambientalmente protegidas (art. 12, § 3º).
Na Reurb-I de imóveis anteriores à 19 de dezembro de 1979 (Lei 6.766/1979) não será necessário apresentar estudos técnicos. (art. 69, § 2º).
Os estudos técnicos serão realizados pelo próprio município quando houver órgão legalmente habilitado. Quando não houver, os estudos serão atribuição do Estado (art. 12, § 5º).
Por fim, a Lei 13.465/2017 define que a aprovação municipal da Reurb corresponde à aprovação ambiental, se no município houver órgão ambiental capacitado.
Vlll. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A regularização fundiária urbana (Reurb) tem sido por muitos anos um objetivo de diversos governos, entretanto, tem esbarrado em inúmeros fatores que dificultam a sua realização efetiva, a motivação apenas política é uma delas. Ou seja, as normas são abrandadas mas não ao ponto de efetivarem o direito de propriedade de forma plena.
A lei nº 13.465/2017 mais uma vez faz essa tentativa e agora com novos instrumentos que, pelo menos num primeiro momento, parecem propícios para resolver uma boa parte das irregularidades fundiárias urbanas. A titulação através da Legitimação Fundiária, é um deles, assim como o é também a dispensa de apresentação de comprovantes tributários e de penalidades tributárias na efetivação do registro do direito real aos beneficiários. Ou seja, a regularização fundiária poderá ser realizada com um custo menor ou até mesmo sem custo para o beneficiário, a depender da situação concreta.
Cabem aos atores do processo de Reurb (Prefeituras, Cartórios, população beneficiada, prestadores de serviços públicos, MP, Judiciário, Defensoria Pública) uma posição proativa a fim de concretizar o direito de propriedade pleno. Cabe a cada um o “querer fazer”. Inúmeras dificuldades vão existir, mas se todos trabalharmos juntos, com uma motivação correta – ter uma cidade melhor com seus imóveis regularizados e, especialmente, com uma melhor qualidade de vida, teremos sim o êxito.
3 comentários para “Uma das modalidades de regularização fundiária”
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Nossa legal esse guia, quem escreveu isso do Reurb nem imaginava sobre essa lei, vai ajudar muito…
Recebi esse link e achei muito interessante essa informação da regularização fundiária! Parabéns a pessoa que desenvolveu esse guia, muito bom.
Guia interessante, importante informação sobre regularização fundiária.
Esclareceu minhas dúvidas.